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Dossiê temático: Tempo-vida e criação

Vol. 3 N.º 2 (2025): Revista Estud(i)os de Dança 6

A autoria nas dramaturgias documentárias e testemunhais: O caso C’est la vie [É a vida], de Mohamed El Khatib

DOI
https://doi.org/10.53072/RED202502/00206

Resumo

Este artigo centra-se na questão da autoria na dramaturgia documentária, investigando de que forma os projetos teatrais baseados em testemunhos reais desafiam o modelo tradicional de autoria. Partindo de uma breve contextualização teórica, que relaciona a noção de dramaturgia segundo teóricos como Pavis (1999) e Danan (2006, 2010a, 2010b), e o caráter híbrido das produções contemporâneas, o estudo foca sobretudo nas práticas colaborativas que emergem no teatro documentário e caracterizam a dramaturgia contemporânea. Por meio da análise do espetáculo C’est la vie [É a vida] (2017), de Mohamed El Khatib, o texto demonstra como a participação ativa do ator Daniel Kenigsberg no partilhar de relatos pessoais leva-o a reivindicar coautoria formal da obra. Este caso expõe tensões centrais: a ambiguidade quanto à propriedade intelectual dos depoimentos e à produção artística da obra, e a eventual necessidade de um acordo prévio que defina claramente papéis e créditos. O artigo argumenta que, em dramaturgias documentárias e testemunhais, nas quais atores ou ‘experts’ contribuem com os seus materiais de vida, a autoria pode distribuir-se por múltiplas camadas de responsabilidade, tensionando a ideia de um único criador. Essa dissolução das fronteiras entre realidade e ficção exige novas convenções legais e éticas para reconhecer todas as vozes envolvidas no processo criativo. Conclui-se que a dramaturgia documentária demanda um redesenho dos conceitos de autoria, incorporando formas de coautoria que reflitam a colaboração intrínseca a estes projetos e assegurem o devido reconhecimento a todos os participantes, dada a complexidade desta forma de fazer e pensar a dramaturgia.

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